Suécia e Noruega de bicicleta : Uma viagem solo

DE GOTEMBURGO (SUÉCIA) AOS FIORDES NORUEGUESES

366,5 km: esta é a distância que percorri entre Gotemburgo (Suécia) e o fiorde Sognefjorden (Noruega).

10 Etapas: este é o número exato de dias de ciclismo efetivo que levei para realizar o percurso. Mas em Oslo e Bergen fiquei 3 dias e em Smögen e Balestrand fiquei 2 dias. Considerando as paradas, a viagem durou 20 dias.

2 países: Suécia e Noruega. Contemplei e explorei tudo com calma. No espaço de poucos dias, encontrei na Suécia encantadoras cidades litorâneas, cidades medievais e as regiões vinícolas da costa sudeste. Na Noruega me encantei com os tons azulados do céu e do mar, com o verde exuberante das florestas e com as majestosas montanhas de picos nevados se refletindo nas águas, enquanto as charmosas casas coloridas acrescentavam um toque especial a essa paisagem deslumbrante.

Minha viagem

1ª Etapa: Gotemburgo / Kungälv / Munkedal (22 km)

Após passar três dias explorando Gotemburgo, chegou o momento de continuar minha jornada em direção à Noruega. Inicialmente, planejei seguir pela costa oeste sueca, explorando especialmente a região de Bohuslän, ao norte de Gotemburgo, através da EuroVelo 12, passando por locais como Grebbestad, Tanumshede, Strömstad e Svinesund antes de chegar à Noruega.

No entanto, o trecho da EuroVelo 12 na Suécia, particularmente a partir de Gotemburgo, ainda estava em desenvolvimento e não estava sinalizado como outras rotas de cicloturismo na Europa. Eu havia lido que alguns trechos poderiam ser perigosos. No site oficial da EuroVelo, havia orientação para uso de transporte público em certas partes, embora não especifique quais.

Confesso que estava bastante insegura com o que havia lido. Foi a primeira vez que recorri a aplicativos de planejamento de rotas. Tinha ouvido falar do planejador de rotas Komoot, uma plataforma popular entre ciclistas. Depois de algumas pesquisas, encontrei uma rota no aplicativo que ia de Gotemburgo a Oslo, a qual segui. Essa rota coincide com a EuroVelo 12 e a EuroVelo 3, conhecida como Rota dos Peregrinos.

Deixando Gotemburgo

No entanto, assim que deixei Gotemburgo, as dificuldades surgiram. A sinalização para ciclistas era praticamente inexistente, e o GPS me levou a uma estrada compartilhada com tráfego intenso. Isso me deixou em dúvida sobre a legalidade de pedalar ali, dado o movimento dos carros.

Decidi parar e verificar com um morador local se estava no caminho certo. Fui informada de que estava correto, pois as estradas na Suécia são abertas para ciclistas, e os motoristas costumam ser receptivos e atenciosos ao compartilhar a estrada.

Apesar disso, a experiência foi tensa, uma vez que eu estava em uma estrada movimentada e sem acostamento. Fiquei imaginando como seria para os peregrinos percorrer aquele trecho.

Por várias vezes parava e conferia o mapa no GPS – nele um traçado em roxo mostrava que realmente eu estava seguindo as rotas EuroVelo 12 e 3. 

Inicialmente, meu plano era continuar até a cidade de Stenungsund. No entanto, eu não me sentia segura nem confortável nessa situação. Quando cheguei a Kungälv, cerca de 22 km de Gotemburgo, parei para reavaliar meus planos.

Viajar por estradas movimentadas e sem acostamento decididamente não é para mim. Eu prefiro encarar colinas íngremes, estradas de cascalhos e trilhas indefinidas em florestas. Em Kungälv decidi ir até a estação de trem para verificar as possibilidades de chegar em alguma outra cidade do percurso. O único trem disponível foi para a cidade de Munkedal, fora da rota, mas facilmente alcançável. Decidi seguir de trem e pernoitar por lá.

2ª Etapa: Munkedal / Smögen (41,6 km)

Logo pela manhã deixei a cidade, sabendo que as estradas compartilhadas fariam parte do meu dia. Teria que seguir devagar e com a atenção triplicada, pedalando pela rota 171 e 174.

A cidade mais próxima de Munkedal na rota é Hunnebostrand. Mas eu havia lido a respeito de uma ilha encantadora e imperdível na Suécia – Smögen. Costas rochosas, casas de pescadores coloridas e lar de alguns dos melhores sanduíches de camarão do país. Não tinha como deixar o lugar de fora.

Para chegar a Smögen era só continuar a rota 171 e depois seguir a 174. E não fazer o desvio para a estradinha (0868) que me levaria a Hunnebostrand. Foi o que fiz. Na estrada tive que compartilhar caminho com caminhões e carros em alta velocidade. As placas de sinalização mostravam que aos carros era permitido trafegar até 80 km por hora. Na minha opinião muito, para quem vai compartilhar a estrada com ciclista.

Seguindo em frente

Enfim, não tinha alternativa – para seguir em direção ao meu destino, tinha que continuar. No trajeto não encontrei nenhum ciclista. Éramos eu, minha bicicleta e um monte de carros a toda velocidade. Apesar do movimento, nenhum motorista, buzinou ou “tirou um fino”. Dava para perceber o respeito com o ciclista.

Devagar e parando quando tinha oportunidade, para aliviar a tensão, relaxava um pouco e seguia.

A tensão vivida na estrada valeu a pena. Depois de 40 km, quando cheguei à ponte que liga o continente à ilha, foi incrível. A vista da Ponte Smögen (Smögenbron) é deslumbrante. Literalmente de encher os olhos. Fiquei parada ali um tempo, ainda não acreditando que havia pedalado entre carros apressados.

Chegando na ilha, descobri a razão do intenso movimento na estrada. Ele estava relacionado ao feriado Nacional na Suécia, era véspera do feriado conhecido como “Sveriges Nationaldag” ou “Dia Nacional da Suécia”. Este dia celebra a assinatura da Constituição Sueca em 6 de junho de 1809, que estabeleceu a base para a estrutura do governo e os direitos dos cidadãos.

Assim que cheguei na ilha, fui conhecer a parte mais bonita, fotogênica e conhecida de Smögen: o chamado Smogen Brygge, um pequeno cais onde há algumas casinhas muito fofas e de cores diferentes e vários restaurantes. Não tive dúvidas, sentei-me em um deles, pedi uma cerveja e claro o melhor sanduíche de camarão aberto do país.

Ali mesmo no cais encontrei um B&B (Bed&Brekfast) muito charmoso e aconchegante. O estresse do dia já havia se dispersado. O lugar realmente é um encanto. Fiquei ali dois dias.

3ª Etapa: Smögen / Grebbestad (63,5 km)

Como o trajeto de Munkedal a Smögen havia sido bastante tenso, estava decidida a buscar um transfer para me levar até a próxima cidade com estação de trem. Foi quando meu anfitrião, um sueco muito simpático e prestativo, me mostrou no mapa como seria tranquilo eu retornar para a rota que estava. Ele me convenceu que seria uma perda irreparável seguir de trem e me contou as maravilhas do percurso. Então voltei a pedalar. Um pequeno trecho da estrada seria o mesmo que fiz até Smögen, só que deveria seguir em frente a 174 no sentido de Hunnebostrand, distante apenas 10 km, e dali era só seguir.

Como queria evitar o trânsito, acordei antes do amanhecer. Na Suécia no mês de junho o sol começa a nascer bem cedo. Eram apenas cinco horas da manhã e eu já estava na estrada. Não demorou muito e alcancei Hunnebostrand, uma cidade pequena com cerca de 1700 habitantes, repleta de casas de madeira vermelha, com um clima muito pesqueiro. Apesar de ainda ser muito cedo, passei um tempo percorrendo entre suas docas, até chegar a uma praça onde estão as bandeiras da Suécia, Dinamarca e Noruega, os três países que mais influenciaram a região.

O dia estava lindo, as estradas mais tranquilas e eu pude avançar mais relaxada, contemplando a beleza da região. Bohuslän é uma costa rochosa, com uma infinidade de pequenas ilhas e ilhotas (mais de 8.000), mas não de grande altitude, pois são o resultado do maciço granítico submerso e erodido pela ação dos glaciares. A beleza do lugar me surpreendeu agradavelmente. Li depois que a costa de Bohuslän está listada como “uma das 7 melhores áreas naturais do mundo”.

Fjällbacka

A estrada nesse percurso, diferente do trajeto anterior, tinha mais verde e mais vilarejos ao longo do caminho. Uma outra parada surpreendente foi na pequena Fjällbacka – uma cidade com cerca de 900 habitantes, amplamente conhecida por ser o local onde se passa o romance de Camilla Läckberg (famosa romancista policial). A autora cresceu ali, e nessa cidade também morou a atriz Ingrid Bergman, que foi homenageada com uma pequena praça. A cidadezinha é pequena, mas também bonita.

Deixei minha bicicleta estacionada no cais e fui explorar o lugar, logo me deparei com uma rota chamada Kungsklyftan, que é como uma passagem que corre entre paredes rochosas verticais. Ali a água da chuva jorrava e escoava, tornando o lugar muito especial. No final há uma rocha incrustada na fenda, suspensa

Depois de passar por ela, há uma escada para subir ao topo da colina Vetterberget. Não pensei muito e encarei centenas de degraus até chegar ao topo. Valeu! Há vistas sublimes.

Foi difícil descer a colina, ficaria ali contemplando as paisagens por mais tempo, mas precisava seguir viagem. Dali voltei para a estrada, novamente compartilhei o espaço com carros. Alguns quilômetros depois (13 km) cheguei a Grebbestad.

Uma outra cidadezinha charmosa com seu cais e casinhas de madeira colorida. Grebbestad tradicionalmente subsiste da pesca, principalmente de marisco. Metade de todas as lagostas e lagostins suecos e quase todas as ostras suecas vêm de Grebbestad.

Depois de uma parada em um dos restaurantes no cais segui em busca de um hotel.

4ª Etapa: Grebbestad / Strömstad (47,4 km)

Deixei Grebbestad pela manhã e segui em direção à Tanum. Os primeiros quilômetros a rota me levou por um trecho de floresta.

Na região, os vestígios arqueológicos da Idade do Bronze são particularmente importantes. Em Tanum há algumas gravuras em pedra que datam de até 3.000 anos atrás e que representam cenas da vida e da agricultura, da religião e do comércio. Fiz uma parada no Museu Vitlycke – uma área com cerca de 600 petróglifos.

Depois da visita segui por estradas agora mais tranquilas até chegar a Strömstad, o destino do dia.

Segui direto para o Strandpromenaden, um calçadão panorâmico à beira-mar, repleto de restaurantes e cafés. Fiz uma parada para um lanche e segui em busca de um hotel.

5ª Etapa: Strömstad / Halden (36,9 km)

Antes de seguir viagem, logo pela manhã fiz uma das coisas mais populares em Strömstad – um passeio de barco pelo arquipélago. Visitei as ilhas Koster do Norte e do Sul. A do Sul, a maior delas, tem uma área de três quilômetros quadrados e é um chamariz de trilheiros e ciclistas. As ilhas são livres de carros e percorrê-las de bicicleta foi um privilégio. Passei a manhã ali, aproveitando o isolamento e o silêncio do lugar.

De volta ao porto, peguei uma balsa e retornei a Strömstad, dali avancei por uma longa ciclovia ao lado de uma estrada muito movimentada. O barulho dos carros e caminhões era ensurdecedor, tornando a viagem bastante desagradável. Depois, um desvio me levou para uma estrada compartilhada, mas de trânsito calmo.

Em um determinado trecho da estrada o GPS me colocou em um desvio por uma trilha na floresta. No início fiquei preocupada. Além do isolamento total, não havia marcas de trilha definidas e era mata fechada. Várias vezes parei para confirmar no mapa. Até que comecei a ver algumas placas de sinalização, o que me confortou. As placas sinalizavam que o lugar era histórico. Só descobri depois que naquele terreno Karl XII transportou seu exército para a Noruega em 1718.

O trajeto ali foi difícil e bastante íngreme. Depois de alguns quilômetros a floresta termina em uma estrada ampla de terra, antes de voltar para a estrada principal.

A fronteira Suécia e Noruega

Avancei uns 12 quilômetros e logo cheguei à fronteira entre Suécia e Noruega. Atravessei a fronteira pela Gamla Svinesundsbron, uma ponte que passa pelo fiorde de Ringdalsfjorden. A vista do alto é de tirar o fôlego. Na fronteira não há nenhuma fiscalização.

Assim que deixei a ponte as sinalizações para ciclistas começaram a aparecer. Encontrei a placa da National Cycle 1 (NC1), rota que deveria seguir. Fiquei feliz, essa era a primeira placa que via depois de vários dias pedalando guiada por GPS. Junto com as placas também estão as ciclovias, mas infelizmente ao lado de estradas com alto tráfego de carros.  

Para continuar na NC1, me deparei com um cruzamento na rodovia. O trânsito infernal fez com que eu desistisse de atravessá-la. Não me senti nada segura. Resolvi seguir pela ciclovia que estava e ver onde ia parar. Ela seguiu também ao lado de uma estrada bem movimentada, por uma subida íngreme. Foi um trecho difícil. O percurso me levou para a cidade de Halden.

uma decisão difícil

Quando cheguei estava exausta e sem chip de celular. Talvez por ter mudado de país, minha internet tenha parado de funcionar.

Não achei prudente seguir sem internet, então fui até uma loja para solucionar o problema. Acho que a dificuldade na comunicação atrapalhou e eu saí sem resolver nada.

Diante do cansaço, sem internet e fora da rota decidi ir até a estação de trem e avaliar as possibilidades de transporte até a próxima cidade. Chegando na estação não havia atendimento, o guichê estava fechado e o lugar isolado. Sem saber o que fazer e como já passava das 17 horas, decidi esperar e pegar o primeiro que aparecesse. Não demorou muito e um trem chegou. Um condutor me explicou que estava seguindo para Moss e Oslo.

A rota que eu seguia passa por Moss, era uma possibilidade parar por ali. Mas, já eram 19hs e uma dúvida surgiu – teria lugar para hospedagem? Sem internet não pude verificar. Então decidi seguir direto para Oslo.

Na estação de trem em Oslo, consegui trocar meu chip de internet, busquei por hotel e fui até ele pedalando. Infelizmente bem afastado do centro. Definitivamente cheguei acabada. Foi um dia difícil.

As possibilidades para explorar a Noruega de bicicleta são infinitas. A sinalização é sempre uma placa vermelha escrita em branco, é só escolher o destino e seguir. Os números em verde são as Ciclovias Nacionais (Nasjonal Sykkelruter), são nove rotas nacionais na Noruega. Vontade de fazer todas não faltou.

Fiquei em Oslo três dias para explorar a cidade.

Um dos lugares incríveis em Oslo – Parque de esculturas (The Vigeland Park) São mais de 300 mil metros quadrados de espaço verde, cuidadosamente ornamentado por esculturas em tamanho natural, que contam a história da humanidade. O idealizador do parque, Gustav Vigeland, dedicou, praticamente, toda a sua vida à obra, que hoje é o maior motivo de orgulho da cidade.

Ópera e Ballet Nacional Norueguês

Palácio Real de Oslo e a troca da guarda.

Mas meu tempo estava curto e já não dava para seguir nenhuma delas. Algumas rotas, como a Rallarvegen (n°4), ainda estavam fechadas devido ao gelo. Então para aproveitar um pouco o tempo, resolvi explorar um pouquinho a região dos fiordes – SOGNEFJORD, e as rotas locais. E para iniciar essa etapa fui de Oslo a Bergen (o coração dos Fiordes) de trem, uma viagem de quase 7 horas.

Bergen

Bergen está situada entre sete colinas e cercada por fiordes (braços de mar que avançam entre as imensas montanhas continente adentro), o que a torna um lugar incrível. As montanhas, florestas, lagos e a proximidade com o mar dão à cidade uma paisagem deslumbrante.

Seu centro histórico é compacto e repleto de ruas de paralelepípedos, praças pitorescas e edifícios históricos bem preservados.

O Bryggen é o famoso cais de Bergen, um Patrimônio Mundial da UNESCO, conhecido por suas casas coloridas de madeira que se alinham ao longo do porto. É um dos locais mais icônicos da cidade.

6ª Etapa: Bergen / Vik

Após passar dois dias em Bergen, embarquei em uma jornada de quatro horas de ferry até chegar em Vik, uma pequena e encantadora cidade às margens do Fiorde Sognefjorden. Lá, encontrei um vilarejo tranquilo com trilhas pitorescas, museus singelos e casas de madeira coloridas, tudo cercado por majestosos fiordes e picos de montanhas imponentes.

Assim que pus os pés em Vik, fui arrebatada pela beleza do lugar. O dia estava esplêndido, e a vista dos fiordes era de tirar o fôlego, com as montanhas refletidas nas águas cristalinas. Próximo ao cais, crianças se divertiam nas águas geladas, suas risadas convidativas me induziram a dar um mergulho. Sem hesitar, me lancei na água, aproveitando o calor do sol.

Em seguida, segui em direção ao Bed & Breakfast que havia reservado. No entanto, como ainda era cedo, decidi visitar a Hopperstad Stave Church, um dos destaques da cidade

Esta igreja de madeira é uma das mais antigas da Noruega, datada de 1130, e permanece praticamente inalterada desde o século XVII. Durante sua restauração entre 1885 e 1891, foram encontradas partes ainda mais antigas sob o piso da igreja, assinalando a existência de outras igrejas no mesmo local em épocas passadas.

Uma outra igreja importante em Vik – Hove Stone Church construída por volta do ano 1170. Os historiadores acreditam que ela foi construída por um grande homem que pertencia ao escalão superior da aristocracia norueguesa. Dizem que ele construiu como uma capela privada. É uma pequena igreja com capacidade para apenas cerca de 35 pessoas.

Vik vista do alto

Vik vista do alto

7ª Etapa: Vik / Arnafjord / Vik (53,3 km)

Na manhã seguinte, parti cedo na direção oeste, com destino a Arnafjord, um dos belos braços do  Fiorde Sognefjord.

O percurso me levou por estradas tranquilas, com tráfego escasso, ao longo das margens dos majestosos fiordes. No entanto, as estradas eram sinuosas e muitas vezes íngremes, exigindo um pouco de esforço.

A cada curva do caminho, a natureza se revelava em toda a sua exuberância. Primeiro, as imponentes montanhas dominavam a paisagem, seguidas pela grandiosidade dos fiordes. 

No decorrer do trajeto, atravessei um túnel, o que me deixou um tanto apreensiva, mas logo descobri que era um trecho curto e tranquilo.

Não faltavam também as impressionantes cachoeiras que pontilhavam a rota. 

 

A rota me levou pela reserva natural de Eitrestrondi, conhecida por abrigar diversas espécies de plantas únicas. Não demorei muito para chegar a Arnafjord, que estava a apenas 21 km de distância de Vik. Arnafjord é um pequeno vilarejo com uma única rua e é habitado por cerca de 70 famílias, a maioria delas dedicadas à agricultura.

Ao chegar, o vilarejo estava tranquilo, e eu não avistei ninguém nas redondezas. O silêncio e a beleza do lugar eram um convite à contemplação e à reflexão, então decidi sentar-me à beira do cais e desfrutar o momento de tranquilidade.

No meu retorno a Vik, fiz uma parada no Café Ostebaren, renomado por produzir o seu próprio Gamalost – “queijo velho” exclusivo de Vik. Este café é a última loja de laticínios tradicional remanescente da Noruega e é um verdadeiro tesouro para os amantes de queijo e da cultura local.

8ª Etapa: Vik / Balestrand (29,7 km)

Na manhã seguinte, com uma ponta de tristeza por deixar Vik, dei início à minha jornada em direção a Balestrand.

A trajetória começou com uma bela ciclovia ao lado de um túnel. Na Noruega, é importante destacar que alguns túneis são proibidos para ciclistas, mas felizmente, eles costumam contar com uma ciclovia pelo lado de fora, ao lado do fiorde. Esse trecho foi relativamente curto, e logo me vi em uma estrada compartilhada, sem acostamento e bastante movimentada. No entanto, a paisagem ao redor era simplesmente majestosa. Sempre que encontrava um local seguro para parar, aproveitava para tirar fotos e apreciar a vista.

Os dias continuaram agradáveis, com um sol magnífico e temperaturas amenas. Moradores locais comentam sobre a sorte que eu tive com o clima, uma vez que a Escandinávia é conhecida por suas temperaturas baixas e chuvas frequentes, mesmo na primavera.

No caminho, passei por Vangsnes, onde aguardei o ferry para cruzar o fiorde em direção à Dragsvik, um caminho mais acessível para chegar a Balestrand, meu destino do dia. A travessia de balsa levou apenas 30 minutos e custou cerca de 14 reais, e o melhor é que não houve cobrança extra pelo transporte da bicicleta. O passeio de balsa proporcionou uma perspectiva diferente e impressionante dos fiordes.

Dragsvik

De Dragsvik, continuei pedalando pelos últimos 10 km até Balestrand, ao longo de uma das estradas mais espetaculares que já tive a oportunidade de percorrer.

Cada quilômetro era contemplado com uma vista encantadora que me tentava a parar e admirar.

Finalmente, cheguei à cidade. Vale mencionar que Balestrand já era um destino popular na Europa no século XVIII, conhecido por sua natureza espetacular e pelas condições de luz únicas que atraíam pintores renomados em busca de inspiração.

Kviknes Hotel finalista do "Historic Hotels Worldwide Awards of Excellence 2023"

Kviknes Hotel finalista do “Historic Hotels Worldwide Awards of Excellence 2023”

No Kviknes Hotel, as tradições de hospitalidade remontam a 1752. A família Kvikne, que hoje é proprietária do hotel, assumiu o comando em 1877.

Fiquei dois dias em Balestrand, usufruindo da calma e beleza do lugar. Estilo suíço e estilo dragão são alguns dos estilos usados para construir muitas das casas em Balestrand, que por sinal estão muito bem preservadas, além de outras construções de madeira, típicas da Noruega. A única igreja de madeira de Balestrand é a igreja de St. Olafs com suas 2 lanças, ela serviu de inspiração para o filme da Disney, Frozen.

9ª Etapa: Balestrand / Leikanger / Sogndal / Hafslo (58,1 km)

Partindo de Balestrand, meu próximo destino era a encantadora cidade de Hafslo. Para chegar lá, tinha duas alternativas: a primeira era voltar pelo mesmo caminho até Dragsvik e pegar uma balsa para Hella. A partir de Hella, seguiria de bicicleta por mais 12 km até Leikanger. A segunda opção era pegar diretamente o ferry em Balestrand, com destino a Leikanger. Optei pela segunda alternativa, uma viagem de apenas 15 minutos que custou cerca de 20 reais. Mais uma vez, o passeio de ferry proporcionou uma perspectiva única dos majestosos fiordes noruegueses.

De Leikanger, comecei meu trajeto pedalando por uma ciclovia ao lado da estrada, enfrentando um trecho bastante íngreme. No entanto, essa ciclovia durou pouco, e logo me vi novamente pedalando em estradas compartilhadas, sem acostamento e com tráfego intenso.

Próximo a Sogndal, deparei-me com um grande túnel, mas felizmente, havia uma ciclovia ao lado dele, margeando o fiorde. Após uma rápida parada na cidade, continuei avançando.

O percurso me levou por uma bela região florestal ao lado de um rio caudaloso e de forte correnteza. O som da água que descia foi ensurdecedor, tornando o cenário ainda mais espetacular. Apesar da beleza, as subidas íngremes eram desafiadoras.

Ao sair da floresta, retornei à estrada, que serpenteava por uma serra repleta de curvas. De um lado, um paredão de montanha, do outro, um precipício com o rio correndo lá embaixo.

 

Sogndal

Subi lentamente, formando uma fila de carros atrás de mim, todos pacientemente aguardando a oportunidade de ultrapassagem. Fiquei impressionada com o respeito dos motoristas, estão muito acostumados com os ciclistas nas estradas.

Era impossível atravessar de um fiorde a outro sem enfrentar esses desafios, subindo centenas de metros em poucos quilômetros.

Cerca de uma hora após deixar Sogndal, finalmente cheguei ao meu destino do dia. A subida íngreme com carros alinhados atrás de mim me deixou exausta, mas a paisagem espetacular ao longo do caminho valeu o esforço.

10ª Etapa: Hafslo / Solvorn (14 km)

Um trajeto curto, porém, desafiador. Uma majestosa serra me levou de Hafslo a Solvorn, mas, felizmente, não enfrentei tráfego intenso desta vez. Foi uma etapa de grande beleza, onde a vista panorâmica, a cada subida, me fazia esquecer as dificuldades do caminho.

Solvorn, é uma vila pitoresca e sua principal atração é o cenário deslumbrante que a rodeia. Contornada por montanhas imponentes e margeada pelo magnífico Lustrafjord, a localidade oferece vistas espetaculares de todas os lados. As encantadoras casas de madeira pintadas de branco acrescentam um charme especial à vila.

 

Entretanto, meu objetivo ali era atravessar o rio por balsa e seguir até Urnes, onde se encontra a igreja de madeira mais antiga da Noruega. A travessia durou cerca de 20 minutos, com um custo de aproximadamente 23 reais.

Ao desembarcar em Urnes, encarei uma subida íngreme de 700 metros até a igreja. As igrejas de madeira representam a contribuição norueguesa mais significativa ao patrimônio cultural europeu, e visitar esta igreja foi uma experiência singular que realmente me impressionou.

Igreja deUrnes

Erguida por volta de 1130, durante um período em que a Noruega esteve em processo de cristianização, mas ainda conservava influências pagãs, a Igreja de Urnes é uma fusão notável de elementos cristãos com a ornamentação viking.

Em 1979, a igreja foi inscrita na Lista do Patrimônio Mundial da UNESCO, um reconhecimento de sua importância histórica e arquitetônica, simbolizando a convergência única de influências cristãs e pagãs na arte e arquitetura medieval.

Terminada a visita, voltei ao porto e segui rumo a Hafslo, encerrando a minha jornada de bicicleta pelos fiordes da Noruega. Pedalar por esse cenário inesquecível proporcionou experiências únicas, conectando-me profundamente com a natureza, permitindo-me apreciar a arquitetura tradicional e imergir na autêntica vida norueguesa em meio a paisagens deslumbrantes à beira dos fiordes. Foi uma aventura repleta de memórias que perdurarão para sempre.

A volta

No dia seguinte voltei para Sogndal e de lá um ônibus me levou de volta a Bergen. Minha bicicleta foi transportada sem nenhum problema.

Fiquei mais uns dias em Bergen e de lá um avião me levou até Paris, onde daria início mais uma rota: Paris / Mont-Saint-Michel, assunto para o próximo post.